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Foto do escritorJulietta

O impacto por detrás da mudança de imagem pessoal de artistas femininas potentes

E como Dove Cameron ilustra bem isso

Nascida Chloe Celeste Hosterman, Dove Olivia Cameron, creditada como Dove Cameron, completará 28 anos na terceira e próxima segunda-feira (15) de janeiro. Conhecida, principalmente, por viver as gêmeas Liv e Maddie na série “Liv & Maddie” e Mal em Descendentes, ambas produções do Disney Channel — disponíveis no catálogo brasileiro do Disney+ — Dove é atriz, cantora e compositora. Tendo, ainda, atuado ao lado de Danielle Macdonald e Jennifer Aniston na comédia crítica da Netflix “Dumplin’” — baseada na obra de mesmo nome de Julie Murphy — se consagrou, em parte, pela versatilidade de sua atuação.

(Foto: reprodução/Pinterest/Disney)

Como a maioria das exs estrelas da Disney que tiveram suas carreiras alavancadas através de uma produção musical, a canção “Better in Stereo”, abertura da comédia familiar e televisiva “Liv & Maddie”, foi a primeira vez em que Dove apareceu em um videoclipe da emissora. O clipe, bem famoso entre os fãs da série e do canal, tem mais de trinta e três milhões de visualizações pelo DisneyMusicVEVO no YouTube e ainda acumula, em média, pouco mais de oitocentos mil ouvintes mensais no Spotify. As imagens trazem uma Dove feliz, empolgada e “brilhante”, tal como sua personagem, Liv, era na época. A presença de elementos coloridos, ambientalização natural e a presença de “amigos” ao redor da persona principal no vídeo nada mais é do que uma espécie de “cargo-chefe” das produções disneynáticas. No entanto, não é nada muito novo, diferente ou inovador, considerando a estética muito semelhante a “Once Upon a Dream”, de “A Bela Adormecida”, na voz e interpretação de Emily Osment e “Carry On”, de “Ursos”, documentário disponível no Disney+, interpretada por Olivia Holt. Para os fãs de Dove, não é de se admirar que ela seja veridicamente uma boa atriz, considerando que, para uma garota que estava na fase dos seus 17/18 anos, sua vida já era, certamente, emocionalmente carregada.

(Vídeo: reprodução/Youtube)

Dove fez sua primeira tatuagem aos quatorze anos e, aos quinze, perdeu o pai para a depressão. Algumas fontes apontam que a própria não-aceitação de Philip A. Hosterman sobre sua homosexualidade foi a principal causa para a depressão, que o levou ao suicídio. Da mesma forma, se hoje conhecemos Chloe por Dove, é porque ela decidiu homenagear o falecido pai, já que era do que ele a chamava. “Dove”, em tradução do inglês, pode ser traduzido como “pomba”, talvez, no sentido de “pombinha”. A pomba, que tem como significado mundial a “paz”, também simboliza pureza, simplicidade, harmonia e esperança. Diante de tantos sinônimos significativos, fica-se a interpretação do porquê do apelido. A mudança de nome nada mais é do que uma maneira silenciosa que uma filha amorosa encontrou para se despedir do pai.

Mas que garota não gostaria de estrelar uma produção da Disney? É aí que entra um ponto importante: Dove disse, certa vez em uma entrevista, que quando foi escalada para viver Liv & Maddie, chegou a informar aos produtores que ela não era o exemplo de garota que eles estavam procurando. Com um contrato assinado, ela passou, então, a se moldar dentro de um padrão exigido há muitos anos. Padrões aparentemente rígidos e não muito flexíveis, que por vezes foram a razão para que outros artistas que cresceram nesse meio acabassem tendo uma rigorosa “reviravolta” de comportamento e imagem pessoal. A tatuagem, mencionada no parágrafo acima, é semelhante com o caso de Martina Stoessel — agora creditada como TINI —, que protagonizou o sucesso latino-americano “Violetta”, uma das produções que os fãs consideram ter encerrado a “Época de Ouro” da Disney, que consagrou, Demi Lovato, Miley Cyrus e Selena Gomez ao estrelato. TINI, ou Tini, finalizou a série de três temporadas com pelo menos três tatuagens, sempre escondidas pela produção. A frase que tem em seu pulso direito era “mascarada” nos episódios e shows por alguma espécie de pulseira ou acessório aleatório.

A artista também comentou algumas vezes sobre sempre ter tido noção de sua sexualidade. Dove, que se reconhece publicamente como bisexual e queer, passou por dois términos públicos até então. Tendo namorado e, posteriormente, noivado com seu colega de elenco Ryan McCartan, fez parte da banda The Girl and The Dreamcatcher, em atividade de 2014 a 2016.


A arte por detrás de The Girl and the Dreamcatcher

Com uma cinematografia relativamente leve, sem que “escandalizasse” demais o público, a falecida banda trazia Dove Cameron e Ryan McCartan em uma dupla criativa. Com letras mais maduras, era notável uma leve sexualização de Dove em suas roupas e figurinos — o que pode ser encarado como um estilo próprio, observado em suas vestimentas durante eventos na época da Disney, ou algo que impuseram para ela. É válido mencionar que, em meio ao estilo sensual, havia um nítido contraste entre as roupas de uma garota “americana comum” e uma “bonequinha”, moldada para ser uma espécie de princesa e brilhar nos padrões impostos pela sociedade. De toda forma, Dove sempre permaneceu deslumbrante e linda, sem falhar com as expectativas que impuseram sobre ela.

(Vídeo: reprodução/Youtube)

“Glowing in the Dark” é a canção que mais se assemelha com o estilo produzido musicalmente por ela agora. Com um atmosfera sombria, mas sem fugir do pop genérico que funciona e conquista, ainda é possível se observar a atuação do ex-casal em uma química gostosa e equilibrada. Já em “Make You Stay”, temos uma narração visual sobre uma garota que vive num relacionamento conturbado. Com partição de Luke Benward, co-estrela de Dove no filme “Cloud 9”, é apontado como icônico — não necessariamente por algo positivo — devido ao aparente complicado término de Dove e Luke. As temáticas mais adultas eram, no entanto, bem trabalhadas e, se as coisas tivessem tomado rumos diferentes, talvez ainda pudéssemos escutar músicas boas e nostálgicas como as deles.


“Descendentes”, Thomas Doherty e Cameron Boyce

Durante as gravações do segundo filme da franquia de “Descendentes", Dove Cameron e Thomas Doherty começaram a namorar. O relacionamento durou quatro anos e terminou durante a pandemia, em 2020, pouco mais de um ano após o falecimento de Cameron Boyce, colega de elenco do casal e um dos amigos mais chegados de Dove. Os fãs apontam o falecimento de Boyce — devido a um evento inesperado causado pela epilepsia — como uma das principais razões para a mudança de expressão tão repentina na essência de Dove. Por ser impossível ditar o processo do luto, não é possível afirmar como a artista lidou com esses detalhes em sua vida pessoal. Mas, ainda assim, é compreensível que mudanças ocorram nas pessoas que vivenciam situações como essa. “Descendentes” marcou a saída de Dove Cameron da Disney e o ponto de partida em sua carreira musical solo.

(Foto: reprodução/Pinterest)


“We Belong”, “LazyBaby” e as primeiras transformações de Dove

Em 2020, Dove cantou a balada romântica “We Belong”, tema de “After - Depois da Verdade” (After We Collided), o segundo filme da franquia estrelada por Josephine Langford e Hero Fiennes-Tiffin. Já em 2021, o single “LazyBaby”, inspirado pelo relacionamento de Dove e Doherty, foi o início de uma mudança significativa na imagem da artista.

Com figurinos mais maduros, a balada sexy trouxe Dove Cameron em sua vulnerabilidade pop e envolvente, perfeita para “gente como a gente”. Ousada, decidida e empoderada, Dove brilhou como um verdadeiro sol em meio aos itens dourados e prateados que compõem seu videoclipe. A postura adulta lhe cai bem, encerrando, de certa forma, a imagem de “princesinha vivendo em um mundo cor de rosa”, ainda presente em “We Belong”. Sobre a música falar acerca dela e do ex-namorado, em entrevista ao Entertainment Tonight, em 2021, Dove disse que “Eu mandei para ele [Thomas] antes de estrear [a música], e ele ainda me manda mensagens de voz o tempo todo”, reafirmando que os dois mantiveram uma amizade na época.


“Boyfriend”, músicas arquivadas, parceria com Khalid e a postura da verdadeira Dove finalmente assumida

Em fevereiro de 2022, Dove Cameron lançou seu single “Boyfriend”. Sucesso na internet, principalmente na rede social Tik Tok, foi onde a sexualidade da artista ficou, de vez, escancarada para o público. Por mais que já tivesse falado sobre, foi a primeira música em que ela expressou a bisexualidade de maneira tão aberta e explícita, carregando a letra e a informação como algo verdadeiramente natural. Desde então, Dove pediu desculpas aos fãs, avisando que estaria retirando oficialmente das plataformas seus singles anteriores, visto que não se identificava mais com eles. Os videoclipes, traduções e outros ainda se encontram disponíveis no YouTube para acesso por meio de canais de terceiros.

Em fevereiro do ano passado, um dia antes de “Boyfriend” completar um ano de lançamento, a melancólica canção “We Go Down Together”, em parceria com Khalid, chegou às plataformas. Vale lembrar que o trabalho anterior mais semelhante a este, em específico, e ao novo álbum de Dove, foi o single “Glowing in the Dark”, que pode ser interpretado como uma prévia de quem Dove Cameron, na intrínseca de sua trajetória, já reconhecia ser.

Lançado em 1° de dezembro de 2023, seu primeiro álbum desvincula totalmente a imagem que o público podia ter sobre quem é a persona Dove Cameron. Como uma forma artística e melodiosa de manifestação artística, “Alchemical: Volume 1” tem oito faixas, incluindo “Sand”, sua balada dark lançada em novembro do mesmo ano.

(Vídeo: reprodução/Youtube)

Agora, com uma construção estética, vocal e pessoal diferenciada do que mostrara no princípio de sua carreira, a nova versão pública de Dove Cameron é uma forte candidata às posições mais altas de estreias musicais.


Mas por que essas mudanças ocorrem?

Para a maioria das meninas, agora mulheres — ou quase — da nomeada “Geração Z”, é provável que suas personalidades tenham sido moldadas pelas grandes influências pops da atualidade. Em grande parte, aquelas que já foram citadas acima, como Demi Lovato, Miley Cyrus, Selena Gomez, Taylor Swift…

Aquilo que consumimos possui, de fato, grande influência na pessoa que nos tornamos. Da mesma forma, acontece com pessoas que estão do outro lado: aquelas que nos influenciam, muitas vezes, sendo colocadas em uma espécie de “caixinha” falsamente glamurosa. O que para nós é entretenimento, para outras pode não passar de trabalho quando começam a ser polidas; e pessoas controladas excessivamente tendem a explodir em algum momento porque, assim como todos, elas crescem, mas a caixinha vai se tornando pequena.

Quando colocamos uma pessoa num pedestal, normalmente é através de uma espécie de admiração. Nossos gostos, no entanto, podem mudar com o tempo, e aquela representação ou imagem não será mais válida ou tão interessante. E a mesma coisa acontece com a pessoa exposta como produto comercial. A Disney, a casa mágica dos sonhos da maioria dos artistas, carrega um nome de peso em nossa infância, e por seus valores pessoais, não pode correr risco de cair nos braços do famoso “cancelamento”, prática doentia abordada por grande parte dos internautas nos tempos atuais. Entre esse e outros fatores, os quais não são necessariamente exigidos nesta discussão, podem vir a se tornar um pesadelo para aqueles que pensavam estar realizando um sonho.

É entendível que a marca, por exemplo, possua uma nostalgia cravada em seus conteúdos. As animações clássicas das princesas, por exemplo, são um conteúdo do qual podemos acessar “a qualquer hora” e não irão sofrer alterações bruscas. Devido a esse sentimento, é involuntário o querer, muitas vezes, de vermos aqueles artistas que marcaram uma fase importante da nossa vida do mesmo jeito, para que possamos sempre nos remeter as boas lembranças. E é aí que entra o grande problema: se o tempo passa e deve passar para nós, essas pessoas deveriam ter o mesmo direito de evoluir. Pense por este lado: se sua artista predileta permanecesse para sempre no mesmo estilo de quando começou a carreira dela, com os mesmos trabalhos, você não pensaria que ela é medrosa para explorar outros gêneros? Que ela não é talentosa o suficiente para dar conta de coisas diferentes? Grande parte dos conteúdos que nos marcaram continuarão no mesmo lugar para assistirmos e consumirmos a hora que bem entendermos.

As mudanças drásticas que nos assustam acontecem, no final, devido a maneira como queremos controlar aquilo que comercializamos. A nossa vontade de ditar o que é certo ou errado, quando pode divergir na verdade do outro, é desrespeitar o limite alheio. Dove Cameron é apenas um dos exemplos de mulheres que marcaram a vida de inúmeras outras mulheres, de inúmeras outras pessoas, mas precisaram se redescobrir para aguentar sobreviver.

A expectativa que colocamos em alguém que admiramos é a principal causa disso tudo: por não conseguirmos enxergar além de uma persona ou personagem, artistas são obrigados, todos os dias, a radicalizar para encontrarem a própria identidade em meio ao drama e inferno comercial que o público e as empresas acabam gerando para eles, como se fossem máquinas humanas de entretenimento.

(Foto: reprodução/Pinterest)


“Sou tão aberta e tão frágil que sinto que o mundo me permeia o tempo todo e isso resulta em ansiedade, depressão, confusão, solidão e altos e baixos.” — Dove Cameron em entrevista ao ET, em 2020.


Escrito por: Ana Clara Reis

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